António Caires é dono da única empresa que constrói e 'abafa' casas de colmo. A sua 'aventura' começou há mais de 20 anos. Hoje há menos casas de colmo, mas ainda continua a existir trabalho.
"Comecei nisto há mais de 20 anos, tinha 18 ou 19 anos, numa casa que minha avó tinha."
António Caires, construtor de casas de colmo
Vulgarmente denominadas de 'casinhas de Santana', as casas de colmo continuam a ser um dos cartazes turísticos mais famosos da Madeira e uma das suas grandes bandeiras promocionais além fronteiras. Actualmente poucas são as casas de colmo que ainda se mantêm de pé, intactas ou recuperadas. Estima-se que o seu número ande entre as três e as quatro dezenas. A escassez de trigo (colmo) e de mão de obra especializada, assim como o surgimento de novas soluções de habitação mais confortáveis tem levado à redução do número de casas de colmo. Mas, apesar da mudança de hábito, a verdade é que algumas pessoas teimam em manter as suas casas de colmo em bom estado de conservação.
Para isso muito tem contribuído a persistência e dedicação de António Caires, de 47 anos, e o único proprietário de uma empresa que se dedica a este tipo de actividade. O seu percurso começou há muitos anos atrás. "Comecei nisto há mais de 20 anos, tinha 18 ou 19 anos, numa casa que minha avó tinha. A minha avó era velhinha e pediu-me para arranjar pessoal e fazer o trabalho. Peguei no meu carrinho, fui buscar o colmo, arranjei o pessoal e abafámos. A partir daí comecei nisto".
O trabalho feito por António Caires, embora sendo o primeiro, ficou bom, não passou despercebido e logo começaram a surgir pedidos de arranjo e construção de novas casas.
Desde então construiu e restaurou dezenas, senão centenas, de casas de colmo. Mas, hoje, os tempos são outros. "Antigamente os palheiros de zinco que se vê por aí eram todos de colmo, mas as pessoas começaram a cultivar menos trigo e a optar pelo zinco, que tem mais duração. O colmo só dura cinco ou seis anos", explica António Caires.
Trabalho "duro" e maçador
Hoje continuam a surgir trabalhos, mas o seu número tem diminuído, tal como o das casas. "Penso que reduziu um terço o número de casas de colmo". A pesar desta redução, António Caires insiste em manter viva esta tradição e criou há cerca de 10 anos uma empresa especializada neste tipo de trabalhos.
A construção de uma casa de colmo ou o seu 'abafamento' (substituir o colmo velho) é um trabalho "duro" e, até certo ponto, maçador. "A casa só leva colmo, varas e vimes. Quando não há vimes nós metemos arame", explica António Caires, acrescentando que a cobertura de uma casa média demora "um dia com oito a dez homens, mas temos de começar de manhã e acabar à noite".
O custo de um trabalho destes varia conforme o tamanho da casa, mas ronda os 2.000 e 2.500 euros para uma casa média.
Um dos receios deste fã e 'amante' das casas de colmo é que este tipo de habitações tenha os dias contados. As pessoas com experiência neste tipo de trabalho "já são de meia idade. Como isto vai, penso que sim. Antes, o Governo ainda dava um subsídio aos donos das casas, mas parece que não estão a receber."
Trabalhos em hotéis
Mas, nem tudo são más notícias para esta arte secular. A fama e qualidade do trabalho de António Caires já ultrapassou as 'fronteiras' de Santana, onde reside e trabalha. Nos últimos anos tem sido, por várias vezes, requisitado por hotéis e até por estabelecimentos de restauração para fazer trabalhos em colmo.
Os guarda-sóis de muitos hotéis feitos em colmo e a casa existente num conhecido restaurante de Câmara de Lobos são alguns dos trabalhos executados.
No ano passado António Caires diz que cobriu cinco casas de colmo, um número aceitável. "Mas também tenho sido chamado para os lados do Funchal, para arranjar aqueles chapéus dos hotéis. E, há poucos dias, construí e 'abafei' uma casa no 'Lagar', em Câmara de Lobos."
Apesar destes trabalhos fora de Santana, a verdade é que o número de casas de colmo tem vindo a diminuir de ano para ano. António Caires acredita que a tradição deve ser mantida, mas isso não depende apenas dele. Acima de tudo depende dos proprietários das casas existentes e das próprias entidades locais e regionais em manter este 'ex-libris' do concelho de Santana.
Casas de origem primitiva e secular
A origem exacta das casas tradicionais de colmo não é perfeitamente conhecida. Calcula-se que as casas de colmo sejam vestígios das construções primitivas, que eram feitas de madeira e de colmo e que existia de forma abundante por toda a ilha. As casas de colmo têm três tipos de construção: as 'casas de empena de fio', 'casas de empena de meio fio' e 'casas de quatro águas'. As 'casas de fio' têm a empena triangular e são cobertas de restolho desde a cumeeira (topo) até ao solo eram compostas por um sótão para guardar produtos agrícolas e por um piso térreo destinado a habitação. Muito embora tenham servido de tecto a muitas famílias ao longo dos séculos, a verdade é que as casas de palha têm de ter uma manutenção periódica. As casas de colmo têm de ser 'abafadas' de cinco em cinco anos. Para 'abafar' ou 'restolhar' as casas são necessários pelo menos quatro homens com experiência e cerca de 24 a 26 'maranhos' (montes) de palha de trigo, dezenas de varas e arame. DN Madeira
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