É cada vez maior o número de jovens enfermeiros recém-formados que optam por fazer a mala e tentar a sorte em vários países europeus. O facto do Serviço Regional de Saúde não estar a contratar novos profissionais não lhes deixa outra saída.
Juan Carvalho, do Sindicato dos Enfermeiros, olha para este fenómeno particular de emigração com alguma preocupação. É mão-de-obra qualificada, formada em território nacional, com investimento português e que depois não é aproveitada, mesmo quando são conhecidas as carências de pessoal. São jovens que teriam lugar no Serviço Regional de Saúde, que apenas por restrições orçamentais opta por não contratar, apesar de se ter verificado, desde 2007, um elevado número de aposentações na classe dos enfermeiros.
Juan Carvalho diz que se está a trabalhar com equipas muito reduzidas, apesar do risco e da penosidade que a profissão acarreta, e, em alguns casos, sem ninguém mais velho que possa garantir a formação.
Os enfermeiros dentro do sistema estão actualmente sujeitos a horários de trabalho acrescidos e com equipas reduzidas, situação que tem motivado a saída de muitos profissionais que, sem aguentarem a pressão e as fracas condições de trabalho, optam por abandonar a profissão para se dedicarem a outras áreas. Ou então deixam a Função Pública para exercer no privado.
Para os que tentam entrar na carreira as portas estão completamente encerradas. São estes que optam pela emigração, ou então, dada a necessidade de assegurarem um rendimento, acabam por enveredar por outro tipo de actividade.
Há enfermeiros a trabalharem em restaurantes de familiares e conhecidos, a fazer voluntariado, outros como empregados de lojas em vários centros comerciais, ou ainda nas caixas de supermercado.
Para todos estes e para os que se vão formar no futuro, a emigração surge como única oportunidade para países como Inglaterra, Suíça, Irlanda, Estados Unidos e até Arábia Saudita.
Não é que as condições oferecidas sejam más para os jovens enfermeiros. O que Juan Carvalho teme são as repercussões que tudo isto terá a longo prazo no Serviço Regional de Saúde.
Um serviço que não se renova e que não garante uma carteira de profissionais que assegurem a formação dos mais jovens acaba por ter consequências graves a vários níveis.
Questiona mesmo que perante o quadro de carência actual não se utilize a autonomia, como fazem os Açores, para admitir mais enfermeiros. Por isso, entende que esta é, antes de mais, uma questão política. "O SESARAM argumenta com a questão orçamental, mas a verdade é que continua em incumprimento para com os fornecedores e a ter actos de gestão questionáveis. Portanto, parece só não haver dinheiro para a admissão de pessoal".
Juan Carvalho salienta, por outro lado, que este desinvestimento na contratação de profissionais acabará por colocar em causa outros projectos importantes da Região, nomeadamente ao nível da formação superior e da escola de medicina que se pretendia criar e que já foi anunciada.
Recorda que a Madeira tem neste momento duas escolas superiores de enfermagem, sem contar com a Universidade da Madeira, que agora também forma médicos.
Aliás, "quando se iniciou o curso de medicina, um dos grandes objectivos era criar um pólo tecnológico na área da saúde". Facto que iria permitir estabelecer ligações com outras universidade europeias e criar, desta forma, serviços de ponta na área da medicina.
Juan Carvalho tem, contudo, uma certeza: não é por este caminho que se chega lá.
"Não é com uma visão reducionista de olhar a saúde de hoje para amanhã que se criam condições físicas e humanas para atingir estes objectivos".
A recibo verde
Para o Sindicato, tão grave como o desemprego, é o facto do Serviço Regional de Saúde ter neste momento cerca de três dezenas de enfermeiros a Recibo Verde.
Juan Carvalho tem conhecimento de casos não só no Hospital Dr. Nélio Mendonça, mas também nos Marmeleiros e no João de Almada.
A realidade destes profissionais é que estão a prazo na profissão e na vida. A maioria vai exercer a profissão até Outubro, mês das eleições regionais, mas depois dessa data não há quaisquer garantias. Com a agravante, como refere Juan Carvalho, de serem pessoas necessárias aos serviços onde estão colocadas.
Desde 2003 que não é feito um levantamento das necessidades com pessoal, mas os últimos dados em posse do sindicato indicam um quadro de carência de cerca de 2.500 enfermeiros. Contudo, é de prever que esta carência venha a aumentar. Com a crise, muito mais pessoas vão passar a recorrer ao serviço público de saúde, até mesmo aquelas que tradicionalmente recorriam ao privado.
Juan Carvalho recorda que, ainda há poucas semanas, o presidente do Conselho de Administração do SESARAM afirmava que um bom serviço de saúde não se mede pelas instalações, mas sim pelos profissionais.
Pelo andar da carruagem, o que este enfermeiro teme é que podemos chegar a um ponto em que não haverá nem instalações, nem profissionais.
"Não sei onde isto vai parar", desabafa.
DN Madeira
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